08/03/2022 09:34
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DECLARAÇÃO DE VOTO
1. Trata-se de inspeção ordinária levada a efeito nas Unidades Básicas de Saúde-USB e nas Unidades de Saúde da Família-USF do Município de Guajará-Mirim-RO, cujo objeto é a verificação das condições dos serviços prestados aos usuários do serviço de saúde, bem como o levantamento das circunstâncias relacionadas ao controle de medicamentos, instalações físicas, equipamentos, pessoal e atendimento e acompanhamento de suas implementações, conforme delimitada na Portaria n. 633, de 8 de outubro de 2019.
2. Como foi bem delineado pelo eminente Relator, que em seu judicioso Voto acolheu, in totum, as manifestações da Secretaria-Geral de Controle Externo (ID n. 1114042) e do Ministério Público de Contas (ID n. 1136261), deve-se considerar cumprido o escopo da presente fiscalização, em razão do atendimento das determinações contidas nas alíneas “d” e “e” do item II e III, da Decisão Monocrática n. 0166/2020/GCFCS (ID n. 939887), para o fim de homologar o Plano de Ação (ID n. 958331), que contempla as ações a serem executadas, e, ainda, em prestígio ao sistema de precedentes inserto nos arts. 926 e 927 do CPC, de aplicação subsidiária no âmbito do Tribunal de Contas do Estado de Rondônia, na forma do art. 99-A, da Lei Complementar n. 154, de 1996.
3.Instruo, por ser de relevo, que, nos termos dos arts. 926 e 927 do CPC1, a lei deixou de ser o único paradigma obrigatório que vincula a decisão do julgador, de modo que as decisões a serem proferidas devem guardar coerência e integridade ao sistema de precedentes, ou seja, não devem destoar de outras decisões já prolatadas sobre o mesmo tema e envolvendo as mesmas circunstâncias, isso com vistas a conferir maior segurança jurídica e estabilidade à sociedade, excepcionalizando-se, entrementes, a hipótese em que a análise de caso concreto e o precedente aventado sejam distintos (distinguishing), ou quando o próprio entendimento do precedente tiver sido superado pelas peculiaridades do contexto histórico e jurídico daquele momento (overruling).
4.Tergiversar a respeito do cumprimento dessa imposição legal seria vulnerar, segundo o magistério de Ronald Dworkin2, o princípio "da supremacia do Poder Legislativo", ou seja, que as regras nasceram para serem cumpridas no Estado Democrático de Direito e, contrariar essa máxima - não aplicar um precedente sem motivo justificável -, implicaria na violação do pacto Democrático, in verbis:
[...]
Porém, não é qualquer princípio que pode ser invocado para justificar a mudança; caso contrário, nenhuma regra estaria a salvo. É preciso que existam alguns princípios com a importância e outros sem importância e é preciso que existam alguns princípios mais importantes que outros. Esse critério não pode depender das preferências pessoais do juiz, selecionadas em meio a um mar de padrões extrajurídicos respeitáveis, cada um deles podendo ser, em princípio, elegível. Se fosse assim, não poderíamos afirmar a obrigatoriedade de regra alguma. Já que, nesse caso, sempre poderíamos imaginar um juiz cujas preferências, selecionadas entre os padrões extrajurídicos, fossem tais que justificassem uma mudança ou uma reinterpretação radical até mesmo da regra mais arraigada.
Na segunda maneira de considerar o problema, um juiz que se propõe a modificar uma doutrina existente deve levar em consideração alguns padrões importantes que se opõem ao abandono da doutrina estabelecida; esses padrões são, na sua maior parte, princípios. Esses padrões incluem a doutrina da "supremacia do Poder Legislativo", um conjunto de princípios que exige que os tribunais mostrem uma deferência limitada pelos atos do Poder Legislativo. Eles incluem também a doutrina do precedente, outro conjunto de princípios que reflete a equidade e a eficiência que derivam da consistência. As doutrinas da supremacia do Poder Legislativo e do precedente inclinam em favor do status quo, cada uma delas na sua própria esfera, mas não o impõe. Os juízes, no entanto, não têm liberdade para escolher entre os princípios e as políticas que constituem essas doutrinas - também neste caso, se eles fossem livres, nenhuma regra poderia ser considerada obrigatória (sic).
5. Isso porque, se de um lado o julgador deve julgar com isonomia os fatos que se assemelham, tal atitude deve corresponder ao legítimo e exigível direito fundamental subjetivo do jurisdicionado em obter um pronunciamento jurisdicional, sem atalhos olhísticos ou como subproduto de uma escolha do julgador, ao contrário, a sincera expectativa do jurisdicionado é que o seu caso esteja sendo apreciado por julgadores isonômicos.
6. Daí decorre, consequentemente, que toda decisão jurisdicional reclama uma resoluta e responsável crítica científica que dissipe viés de densa carga de subjetividade, a qual gera perigosos e seríssimos erros de decisões, de modo a infirmarem a confiança, legitimidade e SEGURANÇA JURÍDICA mediadas pela ambicionável objetividade, por sua vez, dirigida pelo marco civilizatório que é o Direito.
7. Nessa perspectiva, da análise dos autos, vê-se, sinteticamente, conforme a documentação apresentada pelos responsabilizados, que a Unidade Jurisdicionada atendeu as determinações contidas nas alíneas “d” e “e” do item II e III, da Decisão Monocrática n. 0166/2020/GCFCS (ID n. 939887), bem como restou concretizado o Plano de Ação, às fls. 314 (ID n. 958331), que, por sua vez, contempla as ações necessárias a serem executadas, com a definição dos responsáveis e com a fixação de prazos, para o devido saneamento das inconformidades elencadas no Relatório Conclusivo da Equipe de Auditoria (ID n. 832391).
8. Nesse contexto, evidencia-se que houve o cumprimento satisfatório das determinações emanadas pelo Egrégio Tribunal de Contas do Estado de Rondônia, contudo, como bem ressalvado pelo eminente Relator, por se tratar de um serviço, constitucionalmente garantido no art. 196 da CF/88, em razão da relevância do serviço de saúde, há que ser objeto de constante fiscalização e controle, razão pela qual o plano de ação, ora homologado, deve ser constantemente monitoramento, razão pela qual mister se faz determinar, por consequência, a abertura de processo de monitoramento, para ser acompanhado pela equipe de auditoria, nos termos dos arts. 21 e 26, da Resolução n. 228/2016-TCE/RO.
9. A propósito de prestigiar o cogente sistema de precedentes e forte em manter a coerência, integridade e segurança jurídica, sobre o tema em debate, o eminente Conselheiro FRANCISCO CARVALHO DA SILVA, conforme se abstrai dos autos do Processo n. 1.700/2020-TCE-RO, do qual dimanou o Acórdão APL-TC n. 00145/21, pronunciou-se, ipsis litteris:
AUDITORIA ESPECIAL. PRIMEIRO MONITORAMENTO. SERVIÇO DE SAÚDE. UNIDADES DE SAÚDE. PRONTO ATENDIMENTO. PLANO DE AÇÃO. RELATÓRIO DE EXECUÇÃO. CUMPRIMENTO PARCIAL. FASE EXAURIDA. DETERMINAÇÕES. ARQUIVAMENTO.
1. O monitoramento dos planos de ação encaminhados à Corte de Contas tem por objetivo dar efetividade às ações planejadas para sanar as deficiências identificadas na auditoria operacional.
2. Realizada a auditoria operacional, e identificadas deficiências no objeto auditado, serão realizados três monitoramentos com o objetivo de aferir o cumprimento das metas e/ou prazos estabelecidos no plano de ação apresentado, nos termos do disposto na Resolução 228/2016.
3. Caso evidenciado no primeiro monitoramento o cumprimento parcial das medidas contidas no plano de ação apresentado, cabe determinação aos gestores visando a implementação das medidas remanescentes.
4. Exaurida a primeira fase do monitoramento, deve ser determinado o arquivado dos autos.
5. Em cumprimento ao disposto na resolução 228/2016, deve ser determinado a SGCE que dê início a segunda fase do monitoramento do plano de ação, para acompanhamento das ações que ainda não foram implementadas, em processo separado. (sic) (Grifou-se).
10. Naquela ocasião, inclusive, fiz consignar Declaração de Voto, no mesmo sentido, in verbis:
DECLARAÇÃO DE VOTO CONSELHEIRO WILBER CARLOS DOS SANTOS COIMBRA
1. Trata-se de processo autuado para monitoramento da auditoria realizada por este Tribunal de Contas, para a verificação do cumprimento das determinações constantes do Acórdão APL-TC n. 0054/20, exarado no Processo n. 00843/2019-TCE-RO, atinente à fiscalização denominada “Blitz da Saúde”, realizada nas Unidades de Pronto Atendimento de Porto Velho-RO.
2. Como foi bem delineado pelo eminente Relator, que em seu judicioso Voto acolhe as manifestações da Secretaria-Geral de Controle Externo (ID n. 937333) e do Ministério Público de Contas (ID n. 1038173), após regular tramitação do processo, constatou-se, embora emerjam medidas que ainda não foram devidamente implementadas, nos termos da Resolução n. 228/2016-TCE-RO, há que ser fixadas determinações para que se materialize a continuidade das ações necessárias para o integral cumprimento do escopo da fiscalização.
3. Nesse contexto, emerge a necessidade de se determinar, conforme estabelece a Resolução n. 228/2016/TCE-RO, nos arts. 21 e 26, o devido processo de monitoramento da execução do plano apresentado, posicionamento este que foi corroborado pela Secretaria-Geral de Controle Externo e pelo Ministério Público de Contas.
4. Dessarte, entendo que não há que se cogitar aplicação de multa, senão porque a SGCE, em sua peça inicial, não propugnou por aplicação de sanção aos gestores, que continuam obrigados ao cumprimento integral do Plano de Ação, devendo comprovar o atendimento das medidas não implementadas nos prazos estipulados, bem como, em segundo lugar, mas não menos importante, por considerar o atual cenário da Pandemia da COVID-19 em que se denota o esforço desempenhado pelos setores de saúde pública, nos exercícios de 2020 e de 2021, para a minimizar os efeitos deletérios que aplacam a saúde pública municipal, razões pelas quais descabem a aplicação de sanções pecuniárias.
5. Desse modo, orientado pela coerência, integridade e estabilização das decisões deste Tribunal, porque ausente singularidade e com o olhar fito na inafastável segurança jurídica, CONVIRJO, às inteiras, com o eminente Relator, Conselheiro FRANCISCO CARVALHO DA SILVA, para o fim de CONSIDERAR CUMPRIDO o 1º monitoramento de execução das metas fixadas no Plano de Ação (ID n. 935576), homologado pelo Acórdão APL-TC n. 00054/20, relativo ao Processo n. 00843/2019, nada obstante a necessidade de reiteração e fixação de novas determinações, conforme consignado na parte dispositiva do Voto.
6. É como voto. (sic) (grifou-se).
11. Destarte, orientado pela coerência, integridade e estabilização das decisões deste Tribunal, porque ausente singularidade e com o olhar fito na inafastável segurança jurídica, por consequência, CONVIRJO, às inteiras, com o eminente Conselheiro-Relator FRANCISCO CARVALHO DA SILVA, para o fim de considerar cumprido o escopo da presente fiscalização, uma vez que restou comprovado o atendimento das medidas contidas nas alíneas “d” e “e” do item II, bem como do item III, da Decisão Monocrática n. 0166/2020/GCFCS-TCE-RO (ID n. 939887), para o fim de Homologar o Plano de Ação (ID n. 958331), por parte dos responsáveis, os Senhores CÍCERO ALVES DE NORONHA FILHO, CPF sob o n. 349.324.612-91, ex-Prefeito do Município de Guajará-Mirim-RO, e DOUGLAS DAGOBERTO DE PAULA, CPF n. 687.226.216-87, ex-Secretário Municipal de Saúde de Guajará-Mirim-RO, em observância ao que dispõem os arts. 21, §1º e 26, ambos da Resolução n. 228/2016-TCE/RO, sem prejuízos de fixação de novas determinações em processo específico a ser autuado para o monitoramento das medidas apresentadas do retrorreferido plano de ação.
É como voto.
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1. Art. 926. Os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente.
§ 1º Na forma estabelecida e segundo os pressupostos fixados no regimento interno, os tribunais editarão enunciados de súmula correspondentes a sua jurisprudência dominante.
§ 2º Ao editar enunciados de súmula, os tribunais devem ater-se às circunstâncias fáticas dos precedentes que motivaram sua criação.
Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão:
I - as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade;
II - os enunciados de súmula vinculante;
III - os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos;
IV - os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional;
V - a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados.
§ 1º Os juízes e os tribunais observarão o disposto no art. 10 e no art. 489, § 1º , quando decidirem com fundamento neste artigo.
§ 2º A alteração de tese jurídica adotada em enunciado de súmula ou em julgamento de casos repetitivos poderá ser precedida de audiências públicas e da participação de pessoas, órgãos ou entidades que possam contribuir para a rediscussão da tese.
§ 3º Na hipótese de alteração de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos, pode haver modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica.
§ 4º A modificação de enunciado de súmula, de jurisprudência pacificada ou de tese adotada em julgamento de casos repetitivos observará a necessidade de fundamentação adequada e específica, considerando os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia.
§ 5º Os tribunais darão publicidade a seus precedentes, organizando-os por questão jurídica decidida e divulgando-os, preferencialmente, na rede mundial de computadores.
2. DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Trad. Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002. p. 60.
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