Informações da Sessão

Número
Virtual
Tipo
Virtual
Órgão Julgador
D2ªC-SPJ
Abertura
14/03/2022 às 00:03
Fechamento
07/04/2022 às 09:04
Situação
Encerrada

PROCESSO nº 02737/20 - RELATOR: BENEDITO ANTÔNIO ALVES

  • Data da Autuação: 06/10/2020
  • Subcategoria: Prestação de Contas
  • Assunto: Encaminha PRESTAÇÃO DE CONTAS relativa ao exercício de 2019
  • Jurisdicionado: Instituto de Previdência de Machadinho do Oeste
  • Estágio: Arquivado

Votação

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  • 2 Diverge do Relator
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Membro Voto
FRANCISCO CARVALHO DA SILVA
FRANCISCO CARVALHO DA SILVA

Acompanha a Divergência

15/03/2022 10:22

Acompanho a divergência.

WILBER COIMBRA
WILBER COIMBRA

Diverge do Relator

14/03/2022 15:02

                                                         DECLARAÇÃO DE VOTO



I – RESUMO INTRODUTÓRIO DO CONTEXTO DO VOTO

1.    No exame que empreendi no voto do nobre Relator, Conselheiro BENEDITO ANTÔNIO ALVES, verifiquei, data vênia, haver equívoco na fundamentação adotada pelo eminente Conselheiro, que o conduziu ao juízo de mérito pelo JULGAMENTO REGULAR das contas do EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2019 do INSTITUTO DE PREVIDÊNCIA DO MUNICÍPIO DE MACHADINHO DO OESTE-RO.

2.    Ante a essa constatação, com o mais elevado respeito ao nobre Conselheiro Relator, imperioso, no ponto, DIVERGIR do seu entendimento, com fundamento nas razões que passo a expor.

3.    É de se vê, que a instrução empreendida no feito revela que o trabalho da SGCE (ID n. 1077112) apurou falhas formais consistentes em (i) subavaliação da conta Caixa e Equivalente de caixa; (ii) falha na apresentação do Balanço Financeiro, em desacordo com a estrutura do MCASP e IPC 06; (iii) envio intempestivo de balancete mensal; (iv) deficiência na transparência das informações no Portal de Transparência; e, (v) não atingimento da meta atuarial quanto a rentabilidade dos investimentos.

4.    Diante desse contexto, com fundamento nas regras da Súmula n. 17/TCE-RO, portanto, sem oportunização do contraditório e da ampla defesa ao Jurisdicionado, aquela Unidade Especializada pugnou pelo julgamento regular, com ressalvas das contas sub examine.

5.    Por seu turno, o Ministério Público de Contas, divergiu da conclusão da SGCE, consoante consta do Parecer n. 0005/2022-GPYFM (ID n. 1147244).

6.    O Órgão Ministerial Especial embasou seu opinativo no novel entendimento deste Tribunal de Contas que assentou nova compreensão jurídica de que falhas formais detectadas no exame das contas e não submetidas ao crivo do contraditório e da ampla defesa, ferem o devido processo legal e, desse modo, quando do julgamento do mérito, o relator deve afastar sua incidência e julgar as contas pela regularidade.

7.    O Parquet Especial amparou sua manifestação no fato de que a Súmula n. 17/TCE-RO – que era a regra infralegal que sustentava a aposição de ressalvas às contas mesmo sem a oitiva do Jurisdicionado, em clara afronta ao devido processo legal substancial – resta totalmente cancelada não produzindo mais nenhum efeito jurídico no mundo dos homens, consoante decisão manifestada no Acórdão APL-TC 00228/21, proferido nos autos do Processo n. 1.832/2021/TCE-RO.

8.    O ilustre Relator, consoante fundamentos que fez discorrer ao logo do voto, refutou o encaminhamento técnico e acolheu integralmente o opinativo ministerial, e, por consectário, apresentou voto para JULGAR REGULARES as contas em debate.

9.    Nesse sentido, inclusive, fez colacionar, em alinho ao trabalho ministerial, decisões de minha lavra – Acórdão AC1-TC 00336/21, Processo n. 1.089/2019/TCE-RO e AC1-TC 00389/21, Processo n. 2.680/2020/TCE-RO, este último da relatoria do Conselheiro-Substituto OMAR PIRES DIAS, em substituição regimental ao Conselheiro BENEDITO ANTÔNIO ALVES, no qual fui Relator para o acórdão – que no seu entendimento se adequam ao caso ora examinado.

II – LOCALIZAÇÃO, NO TEMPO E NO ESPAÇO, DO NOVEL ENTENDIMENTO DESTE TRIBUNAL DE CONTAS ACERCA DA SÚMULA N. 17/TCE-RO

II.I – Da vigência da Súmula n. 17/TCE-RO

10.    Ab initio, reputo com indispensável traçar uma linha do tempo, porquanto é condition sine qua non para demonstrar, data vênia, o equívoco no qual incorre o Relator.

11.    Inicio dizendo que, de há muito, a existência da Súmula n. 17/TCE-RO me incomodava, porquanto, ulcerava, em meu sentir, o mandamento constitucional do devido processo legal substancial e seus corolários da ampla defesa e do contraditório.

12.    Mesmo com a sua legítima vigência, jamais me senti confortável em aplicar a referida súmula para fundamentar decisões que ressalvassem a regularidade de contas – sem que o Jurisdicionado pudesse se defender das falhas formais a ele imputadas – sob o argumento de que as ressalvas não traziam prejuízo à Parte.

13.    Apenas para ilustrar, mesmo antes de se iniciarem as discussões que modificaram o entendimento deste Tribunal de Controle, eu já exarava decisões no sentido de afastar a aplicação do Verbete Sumular em evidência, por ausência da oportunização da ampla defesa e do contraditório que, via reflexa, solapa o princípio constitucional do devido processo legal substancial, consagrados nos incisos LIV e LV da CF/1988.

14.    Nesse sentido, a exemplo, sob minha presidência, tem-se o Acórdão AC1-TC 00904/20, prolatado nos autos do Processo n. 2.566/2018/TCE-RO.

II.II – Da decisão por não mais aplicar a Súmula n. 17/TCE-RO e seus efeitos

15.    Anoto ser bem verdade que a discussão que iniciei na sessão do Pleno do dia 27/5/2021, na apreciação dos autos do Processo n. 1.630/2020/TCE-RO, da Relatoria do Conselheiro EDILSON DE SOUSA SILVA, acerca da impossibilidade de se continuar empregando o entendimento consignado na Súmula n. 17/TCE-RO na apreciação e julgamento das Contas de Governo e Contas de Gestão, resultou, de imediato, na compreensão de que era imperioso afastar a aplicação do mencionado enunciado sumular.

16.    Isso porque restou finalmente compreendido, em ampla escala pelo Colegiado Pleno, que tal regra não servia para embasar a aposição de ressalvas decorrentes de falhas formais não oportunizadas ao crivo do contraditório e da ampla defesa dos Jurisdicionados, porque vulnerava o devido processo legal substancial.

17.    Desde essa novel compreensão, que foi acolhida pelos nobres Pares, passei a tangenciar todos os processos de prestação de contas sob minha relatoria aos auspícios desse novo entendimento.

18.    E, é essa moldura, portanto, que se observa no teor dos votos que resultaram nos Acórdãos AC1-TC 00336/21 (Processo n. 1.089/2019/TCE-RO) e AC1-TC 00389/21, Processo n. 2.680/2020/TCE-RO), referenciados pelo Relator em seu voto.

19.    Naquele momento, na linha do tempo, no julgamento daquelas contas, com fundamento nessa nova compreensão, afastei a incidência da Súmula n. 17/TCE-RO, e desconsiderei as falhas formais não submetidas ao contraditório que estavam a impingir ressalvas às contas, e, por consectário, julguei-as pela regularidade.

20.    Esse destaque se faz necessário, localizando-o no tempo e no espaço – a partir da data da sessão plenária de 27/5/2021 – para demonstrar que essas decisões foram exaradas com fundamento na nova compreensão exsurgida de não mais aplicar o regramento da Súmula n. 17/TCE-RO.

21.    É preciso estabelecer esse marco porque na data de 8/7/2021, também em sessão plenária, retomou-se a apreciação, em definitivo, do Processo n. 1.630/2021/TCE-RO, da Relatoria do Conselheiro EDILSON DE SOUSA SILVA, ocasião em que, evoluída a discussão acerca do não cabimento do regramento da Súmula n. 17/TCE-RO na apreciação ou julgamento com ressalvas de contas sem que se prestigiasse a ampla defesa e o contraditório, aquele Relator fixou, mediante o item V do Acórdão APL-TC 00162/21, a seguinte tese jurídica, ipsis verbis:


[...]
V- Fixar a tese jurídica de que os processos de contas de governo relativos ao exercício de 2020 e dos exercícios subsequentes, na hipótese de irregularidade de caráter meramente formal, passarão a ser julgadas regulares, com exclusão da ressalva, recebendo eficácia prospectiva, a luz do princípio da segurança jurídica e a fim de assegurar a efetividade dos processos que estão na iminência de sua conclusão;
[...]

 

22.    De se ver, portanto, em uma leitura mais ampliada, que nesse ponto restou estabelecido um marco temporal no qual seria mantida a aplicação da regra da Súmula n. 17/TCE-RO para o julgamento das contas relativas a até o exercício financeiro de 2019.

23.    Tal regra restou fixada, dada a imprescindível necessidade de se prestigiar a segurança jurídica, haja vista que até aquele período do ano – julho de 2021 – em que se fixou a tese jurídica, diversas contas relativas a até o exercício financeiro de 2019, já haviam sido julgadas e apreciadas sob a égide da Súmula n. 17/TCE-RO.

24.    Por essa razão não se mostrava razoável aplicar entendimento diverso para as contas de mesmo exercício financeiro pendentes de julgamento, isso porque se revelaria de extrema insegurança jurídica dar desfechos distintos para fatos semelhantes.

25.    Em referência às contas do exercício financeiro de 2020 em diante, não há mais que se falar no emprego do regramento sumular.

26.    Se houver, portanto, em contas a partir de 2020, apontamentos de irregularidades formais que não tenham sido submetidos às rédeas da ampla defesa e do contraditório, a medida que se impõe é desconsiderá-las, para o fim de exarar juízo de regularidade/aprovação plena das contas.

27.    É necessário registrar que embora o texto do item V, do Acórdão APL-TC 00162/21 mencione somente Contas de Governo, inclusive, porque a decisão se materializou em autos dessa espécie – Processo n. 1.630/2020/TCER, Prestação de Contas do MUNICÍPIO DE CORUMBIARA-RO – por interpretação extensiva e sistemática do art. 16, da LC n. 154 de 1996, a tese jurídica também é aplicável às Contas de Gestão.

28.    De se dizer, ainda, que por força do novo entendimento, as infringências formais apuradas, mas não consideradas para o mérito, servirão para consubstanciar determinações ao Jurisdicionado, tendo por desiderato a melhoria e o aperfeiçoamento da gestão.

29. Nesse ponto, na linha do tempo, a partir das contas do exercício financeiro de 2020, nenhuma força normativa acudia mais a Súmula n. 17/TCE-RO, entrementes, aquele verbete sumular ainda permanecia vigente no mundo jurídico, com potencial, como dito, para exercer legítima influência sobre as contas reativas a até o exercício financeiro de 2019.

30.    Veja-se, a propósito, decisões sobre contas do exercício financeiro de 2019 sob essa moldura, dessa feita, Acórdão AC1-TC 00551/21 (Processo n. 2.720/2020/TCE-RO, de minha relatoria), AC2-TC 00256/21 (Processo n. 2.899/2020/TCE-RO, Conselheiro JOSÉ EULER POTYGUARA PEREIRA DE MELLO), AC2-TC 00230/21 (Processo n. 2.789/2020/TCE-RO, Conselheiro EDILSON DE SOUSA SILVA), ACI-TC 00591/21 (Processo n. 2.582/2020/TCE-RO, Conselheiro VALDIVINO CRISPIM DE SOUZA), Acórdão AC1-TC 00630/21 (Processo n. 1.897/2020/TCE-RO, Conselheiro BENEDITO ANTÔNIO ALVES, em que fui relator para o Acórdão).

II.III – Do cancelamento da Súmula n. 17/TCE-RO e seus efeitos

31.    Na sequência desse processo evolutivo, e em igual perspectiva, em outubro de 2021, ainda por consequência da discussão que inaugurei na sessão plenária de 27/5/2021, já referenciada em linhas precedentes, como golpe definitivo a expurgar integralmente do mundo jurídico a teratologia da Súmula n. 17/TCE-RO, dei início ao trabalho que resultou no cancelamento em definitivo da mencionada regra infralegal.

32.    Autuado nos autos do Processo n. 1.832/2021/TCE-RO, esse debate resultou, como já mencionado, no cancelamento da Súmula n. 17/TCE-RO, materializado no Acórdão APL-TC 00228/21, que assentou decisão confirmando, de forma robusta, o entendimento fixado pelo Acórdão APL-TC 00162/21 (Processo n. 1.630/2021/TCE-RO).

33.    Assim, ao cancelar o enunciado sumular em referência, estabeleceu-se um intervalo temporal – contas de exercícios financeiros até 2019 – no qual será possível aplicar o regramento da Súmula n. 17/TCE-RO, e, a partir das contas do exercício financeiro de 2020, não há mais que se falar no emprego daquela regra.

34.    Veja-se, o ementário do Acórdão APL-TC 00228/21 exarado no Processo n. 1.832/2021/TCE-RO de minha relatoria, retrorreferido, in litteris:


EMENTA: ADMINISTRATIVO. PROJETO DE CANCELAMENTO DA SÚMULA N. 17/TCE-RO. LEGITIMIDADE DO MAGISTRADO DE CONTAS. APRESENTAÇÃO DE PROJETO CONTENDO AS JUSTIFICATIVAS PARA O CANCELAMENTO DE ENUNCIADO SUMULAR. PREENCHIMENTO DOS PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS. CONHECIMENTO. SUPERAÇÃO DOS FUNDAMENTOS DETERMINANTES QUE EMBASARAM A INSTITUIÇÃO DA MENCIONADA SÚMULA. INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL DA TESE JURÍDICA. CANCELAMENTO DA SÚMULA N. 17/TCE/RO, COM MODULAÇÃO DOS EFEITOS PARA AS CONTAS RELATIVAS AO EXERCÍCIO FINANCEIRO DO ANO DE 2020. PRECEDENTES. DETERMINAÇÕES.
(Destacou-se).
(TCE/RO. Pleno. Acórdão APL-TC 00228/21. Processo n. 1.832/2021/TCE-RO. Relator Conselheiro WILBER CARLOS DOS SANTOS COIMBRA. Data da sessão: 6/10/2021. Data da disponibilização no DOeTCE-RO: 11/10/2021).
 

II.IV – Da breve incursão sobre o dever de observância aos Precedentes e à Segurança Jurídica

35.    Vejo como igualmente indispensável, destacar o prestígio que se deve conceder ao sistema de precedentes, que contribui, sobremaneira, para o fortalecimento da segurança jurídica.

36.    Diga-se que a esse respeito, em razão da premente necessidade de se manter a coerência entre as decisões a serem prolatadas e aquelas já sedimentadas no mundo jurídico no julgamento de matérias símiles, exsurge a necessidade de imersão, ainda que brevíssima, no tema jurisprudência e segurança jurídica.

37.    Assim, destaco que, na forma disciplinada pelos arts. 926 e 927 do CPC, a lei deixou de ser o único paradigma obrigatório que vincula a decisão do julgador; nesse sentido as decisões a serem proferidas devem guardar coerência e integridade com o sistema de precedentes.

38.    Veja-se, o que estabelece os preceptivos legais mencionados, in verbis:


Art. 926. Os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente.
§ 1º Na forma estabelecida e segundo os pressupostos fixados no regimento interno, os tribunais editarão enunciados de súmula correspondentes a sua jurisprudência dominante.
§ 2º Ao editar enunciados de súmula, os tribunais devem ater-se às circunstâncias fáticas dos precedentes que motivaram sua criação.
Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão:
I - as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade;
II - os enunciados de súmula vinculante;
III - os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos;
IV - os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional;
V - a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados.
§ 1º Os juízes e os tribunais observarão o disposto no art. 10 e no art. 489, § 1º , quando decidirem com fundamento neste artigo.
§ 2º A alteração de tese jurídica adotada em enunciado de súmula ou em julgamento de casos repetitivos poderá ser precedida de audiências públicas e da participação de pessoas, órgãos ou entidades que possam contribuir para a rediscussão da tese.
§ 3º Na hipótese de alteração de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos, pode haver modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica.
§ 4º A modificação de enunciado de súmula, de jurisprudência pacificada ou de tese adotada em julgamento de casos repetitivos observará a necessidade de fundamentação adequada e específica, considerando os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia.
§ 5º Os tribunais darão publicidade a seus precedentes, organizando-os por questão jurídica decidida e divulgando-os, preferencialmente, na rede mundial de computadores.
(Grifou-se).

 

39.    Disso, denota-se que o decisum a ser proferido não deve destoar de outras decisões já prolatadas sobre o mesmo tema e envolvendo as mesmas circunstâncias, isso porque há que se conferir maior segurança jurídica e estabilidade à sociedade.

40.    Tal entendimento, contudo, não excepciona a hipótese em que a análise de caso concreto e o precedente aventado sejam distintos (distinguishing), ou, lado outro, quando as peculiaridades do contexto histórico e jurídico daquele momento (overruling) orientem à superação do entendimento do precedente, o que, no entanto, não se verifica, no caso ora em debate.

41.    Resistir a esse dever legal de observância aos precedentes, seria uma clara transgressão ao princípio da "supremacia do Poder Legislativo”, acerca do qual Ronald Dworkin1, ensina que as regras nasceram para serem cumpridas no Estado Democrático de Direito e, contrariar essa máxima – não aplicar um precedente sem motivo justificável – resultaria na violação do pacto Democrático; a propósito, veja-se, excerto esclarecedor, ipsis verbis:

[...]
Porém, não é qualquer princípio que pode ser invocado para justificar a mudança; caso contrário, nenhuma regra estaria a salvo. É preciso que existam alguns princípios com a importância e outros sem importância e é preciso que existam alguns princípios mais importantes que outros. Esse critério não pode depender das preferências pessoais do juiz, selecionadas em meio a um mar de padrões extrajurídicos respeitáveis, cada um deles podendo ser, em princípio, elegível. Se fosse assim, não poderíamos afirmar a obrigatoriedade de regra alguma. Já que, nesse caso, sempre poderíamos imaginar um juiz cujas preferências, selecionadas entre os padrões extrajurídicos, fossem tais que justificassem uma mudança ou uma reinterpretação radical até mesmo da regra mais arraigada.
Na segunda maneira de considerar o problema, um juiz que se propõe a modificar uma doutrina existente deve levar em consideração alguns padrões importantes que se opõem ao abandono da doutrina estabelecida; esses padrões são, na sua maior parte, princípios. Esses padrões incluem a doutrina da "supremacia do Poder Legislativo", um conjunto de princípios que exige que os tribunais mostrem uma deferência limitada pelos atos do Poder Legislativo. Eles incluem também a doutrina do precedente, outro conjunto de princípios que reflete a equidade e a eficiência que derivam da consistência. As doutrinas da supremacia do Poder Legislativo e do precedente inclinam em favor do status quo, cada uma delas na sua própria esfera, mas não o impõe. Os juízes, no entanto, não têm liberdade para escolher entre os princípios e as políticas que constituem essas doutrinas - também neste caso, se eles fossem livres, nenhuma regra poderia ser considerada obrigatória.

 

42.    De se dizer que, se por um lado o julgador tem o dever de julgar com isonomia os fatos que se assemelham, por outro, sua atitude deve corresponder ao legítimo e exigível direito fundamental subjetivo do jurisdicionado em obter um pronunciamento jurisdicional, sem atalhos olhísticos ou como subproduto de uma escolha do julgador.

43.    Isso porque a sincera expectativa do jurisdicionado é que o seu caso esteja sendo apreciado por julgadores isonômicos.

44.    É dizer, em outras palavras, que toda decisão jurisdicional reclama uma resoluta e responsável crítica científica que dissipe qualquer viés de densa carga de subjetividade, a qual gera perigosos e seríssimos erros de decisões, que pode, como consequência, infirmar a confiança, a legitimidade e a SEGURANÇA JURÍDICA mediadas pela indispensável objetividade, por sua vez, dirigida pelo marco civilizatório que é o Direito.

III – DO EXAME DO VOTO

III.I – Da regra a ser prestigiada para tangenciar o juízo de mérito

45.    Feito essa breve, mas necessária incursão, passo a examinar o caso tratado no presente voto.

46.    Obrigo-me, por amor a verdade, a assentar que há veracidade no que consignado no voto do eminente Relator, no que diz respeito ao fundamento por afastar a regra da Súmula n. 17/TCE-RO no julgamento do Processo n. 1.089/2019/TCE-RO, de minha relatoria, que gerou o Acórdão AC1-TC 00336/21.

47.    De igual forma, também é verdadeiro o fato de que o Acórdão APL-TC 00162/21, exarado no Processo n. 1.630/2021/TCE-RO, da relatoria do Conselheiro EDILSON DE SOUSA SILVA, firmou entendimento por afastar o emprego da Súmula n. 17/TCE-RO para embasar o julgamento regular com ressalvas de contas nas quais fossem identificadas falhas formais que não tivessem sido submetidas à ampla defesa e ao contraditório.

48.    No mesmo sentido, como dever de observância à segurança jurídica, o mencionado decisum estabeleceu que os efeitos daquela decisão, seriam aplicadas somente sobre as contas relativas ao exercício financeiro a partir de 2020, permanecendo, por dedução lógica, sua plena vigência para o exame das contas referentes até ao exercício financeiro de 2019.

49.    Também é verídico que, por fim, por intermédio do Processo n. 1.832/2021/TCE-RO, que produziu o Acordão APL-TC 00228/21, sedimentou-se o cancelamento da Súmula n. 17/TCE-RO, mantendo-se, contudo, seus efeitos vigentes para alcançar o julgamento/apreciação de contas relativas a até o exercício financeiro de 2019.

50.    A considerar esse cenário, perfeita estaria a conclusão do Relator para julgar as contas em apreço pela regularidade, porque desconsiderou as falhas formais nelas apuradas, por não terem sido submetidas ao crivo da ampla defesa e do contraditório, em afronta ao devido processo legal substancial, haja vista a impossibilidade de se aplicar o preceito impositivo da Súmula n. 17/TCE-RO.

51.    Ocorre, contudo, que o Relator, data máxima vênia, ao assentar esse desfecho não observou uma minúcia importante e indispensável, que atrai, e impõe, a aplicação do regramento da Súmula n. 17/TCE-RO.

52.    Esse detalhe é o fato de que as contas do INSTITUTO DE PREVIDÊNCIA DO MUNICÍPIO DE MACHADINHO DO OESTE-RO, ora em exame, SE REFEREM AO EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2019, limite temporal esse no qual, nos termos dos Acórdãos APL-TC 00162/21 (Processo n. 1.630/2021/TCE-RO) e APL-TC 00228/21 (Processo n. 1.832/2021/TCE-RO), as contas continuam sendo examinadas sob o escrutínio do verbete sumular n. 17/TCE-RO.

53.    Disso decorre que, em HOMENAGEM À SEGURANÇA JURÍDICA, consoante já exaustivamente debatido, o exame das contas em apreço por parte deste Tribunal de Contas deve ser realizado sob o vaticínio da Súmula n. 17/TCE-RO.

54.    Destaco, a fim de demonstrar – e, principalmente para evitar possíveis alegações nesse sentido – que não há qualquer indício de contradição em meus posicionamentos.

55.    Isso porque a partir das decisões manifestadas nos Acórdãos APL-TC 00162/21 (Processo n. 1.630/2021/TCE-RO) e APL-TC 00228/21 (Processo n. 1.832/2021/TCE-RO), em respeito à decisão do Colegiado Pleno e com olhar firme na segurança jurídica, mantive a aplicação da regra da Súmula n. 17/TCE-RO para as contas que julguei, ou participei como vogal emitindo Declaração de Voto, relativas a até o exercício financeiro de 2019.

56.    Nesse sentido, e.g., destaco os precedentes: Acórdãos APL-TC 00235/21 (Processo n. 1.893/2020/TCE-RO, de minha relatoria), AC1-TC 00895/21 (Processo n. 2.900/2020/TCE-RO, Conselheiro VALDIVINO CRISPIM DE SOUZA), AC1-TC 00716/21 (Processo n. 2.786/2020/TCE-RO, Conselheiro BENEDITO ANTÔNIO ALVES), AC1-TC 00847/21 (Processo n. 1.895/2020/TCE-RO, Conselheiro-Substituto FRANCISCO JÚNIOR FERREIRA DA SILVA, em substituição regimental ao Conselheiro BENEDITO ANTÔNIO ALVES).

57.    Lado outro – com fundamento naquelas decisões que assentaram novo entendimento – para as contas a partir do exercício financeiro de 2020, afastou-se a aplicação do verbete sumular, desconsiderando-se as falhas formais não submetidas a ampla defesa e ao contraditório, e apreciou-se as contas pela aprovação.

58.    Vejam-se, a exemplo, decisões desse jaez: Acórdãos APL-TC 00308/21 (Processo n. 1.150/2021/TCE-RO, de minha relatoria), APL-TC 00314/21 (Processo n. 0957/2021/TCE-RO, Conselheiro JOSÉ EULER POTYGUARA PEREIRA DE MELLO), APL-TC 00319/21 (Processo n. 1.010/2021/TCE-RO, Conselheiro EDILSON DE SOUSA SILVA), AC1-TC 00360/21 (Processo n. 1.348/2021/TCE-RO, Conselheiro VALDIVINO CRISPIM DE SOUZA), APL-TC 00307/21 (Processo n. 1.222/2021/TCE-RO, Conselheiro FRANCISCO CARVALHO DA SILVA), APL-TC 00324/21 (Processo n. 1.228/2021/TCE-RO, Conselheiro BENEDITO ANTÔNIO ALVES).

59.    Há que se dizer, inclusive, que o Relator das contas ora examinadas, eminente Conselheiro BENEDITO ANTÔNIO ALVES, nesta mesma sessão da 2ª Câmara que se desenvolve entre os dias 14 a 18/3/2021, segue essa regra ao JULGAR REGULAR conta do exercício de 2020 (Processo n. 1.055/2021/TCE-RO, item 10 da pauta), afastando a aplicação da Súmula n. 17/TCE-RO, por não ser mais cabível sua incidência, porquanto, como já referenciado, tais contas se referem ao exercício financeiro de 2020, que escapa, desse modo, ao intervalo temporal (exercício financeiro até 2019) ainda subjugado pelo regramento da Súmula n. 17/TCE-RO, hodierno já cancelada.

60.    Anoto, por ser de relevo, que para aquele voto – Processo n. 1.055/2021/TCE-RO, item 10 da pauta – me manifestei, via Declaração de Voto, convergindo com o mérito pelo julgamento regular daquelas contas, consoante juízo do Relator, porquanto – na linha do debate jurídico que ora se evidencia – mostra-se perfeitamente adequado aos precedentes mais recentes deste Tribunal Especializado de Controle Externo.

61.    O ilustre Relator, contudo, com o devido respeito, não mantém para o voto ora em discussão, o mesmo entendimento esposado no voto daqueles autos mencionados (1.055/2021/TCE-RO, item 10 da pauta), na moldura imposta pelas decisões aforadas nos Acórdão APL-TC 00162/21 (Processo n. 1.630/2021/TCE-RO) e APL-TC 00228/21(Processo n. 1.832/2021/TCE-RO).

62.    Em meu sentir, fundado no novel entendimento deste Tribunal de Contas, deve-se manter a aplicação da Súmula n. 17/TCE-RO, para julgamento do presente processo, que trata de contas do exercício financeiro de 2019, no qual deve ser empregado o preceito do regramento sumular mencionado, que por extensão, obriga o julgamento regular, com ressalvas, das presentes contas.

III.II – Do desfecho conclusivo

63.    Assim, em decorrência das falhas formais apuradas, mesmo que tais infringências não tenham sido submetidas à ampla defesa e ao contraditório do Jurisdicionado, DEVE-SE JULGAR AS CONTAS REGULARES, COM RESSALVAS, a fim de se prestigiar a força normativa das decisões materializadas nos Acórdãos APL-TC 00162/21 (Processo n. 1.630/2021/TCE-RO) e APL-TC 00228/21(Processo n. 1.832/2021/TCE-RO), que, consoante já se discorreu de forma detalhada, impõem a aplicação da regra da Súmula n. 17/TCE-RO para contas que se refiram a até o exercício financeiro de 2019, como in casu.

64.    Por todo o exposto, pelos fundamentos aquilatados, arraigado notadamente nos Acórdãos APL-TC 00162/21 (Processo n. 1.630/2021/TCE-RO) e APL-TC 00228/21(Processo n. 1.832/2021/TCE-RO), firme nos precedentes deste Tribunal de Contas que robustecem a segurança jurídica, e subjugado pelo princípio da colegialidade que impõe o dever de se curvar ao entendimento do Pleno deste Tribunal de Contas até que exsurjam relevantes razões para não o fazê-lo, DIVIRJO, RESPEITOSAMENTE, do nobre Relator, Conselheiro BENEDITO ANTÔNIO ALVES, e VOTO por JULGAR REGULARES, COM RESSALVAS, AS CONTAS DO EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2019 do INSTITUTO DE PREVIDÊNCIA DO MUNICÍPIO DE MACHADINHO DO OESTE-RO.

É como voto.

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1. DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Trad. Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002. p. 60.

 

BENEDITO ANTÔNIO ALVES
BENEDITO ANTÔNIO ALVES


Ministério Público de Contas Manifestação
ERNESTO TAVARES VICTORIA
ERNESTO TAVARES VICTORIA

Manifestação Eletrônica do MPC

11/03/2022 07:17

Considerando que existe manifestação ministerial acostada no feito, não vislumbro, no momento, a necessidade de maiores comentários.