07/03/2023 12:15
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Trata-se de Tomada de Contas Especial (TCE), instaurada no âmbito do Instituto de Previdência Social dos Servidores Públicos Municipais de Machadinho do Oeste/RO – IMPREV, para apurar possíveis irregularidades no recebimento de diárias, férias recebidos em dobro, indenizações indevidas e descontos previdenciários indevidos pela Senhora Lucimeire Tamandaré Gonçalves Neves – ex-diretora executiva do referido instituto, no período de 06.12.2011 até 23.04.2015 (conforme consta nos arquivos do SIGAP[1]), que envolveu a cifra de R$ 122.712,93.
Após análise dos autos, a SGCE, em sede de instrução inicial, apontou a ocorrência de prescrição punitiva e ressarcitória, diante do transcurso de prazo superior a cinco anos entre o fim do mandato e a protocolização da TCE em 19 de abril de 2022. Nesse sentido apontou:
[...] Se considerarmos que a responsável exerceu o cargo de diretora administrativa no período de 6 de dezembro de 2011 a 23 de abril de 2015, consoante registro no SIGAP2, não havendo nenhum incidente que interrompesse a prescrição, verifica-se que entre o período final do exercício do mandato e a protocolização do processo de TCE nesta Corte em 19 de abril de 2022, transcorreram aproximadamente 7 (sete) anos, não havendo outro caminho que não reconhecer a prescrição da pretensão ressarcitória e punitiva desta Corte para os fatos de que tratam a presente TCE. [...]
De igual modo, o MPC suscitou a ocorrência de prescrição, ao apontar o término do mandato como termo inicial e, como marco interruptivo da prescrição, a instauração da TCE, bem como a juntada do relatório técnico. Nesse sentido, verificado o transcurso de prazo superior a cinco anos, concluiu pelo reconhecimento da prescrição.
Por fim, o e. Conselheiro Relator apresentou proposta de voto na qual reconhece prescrição, diante do transcurso de cinco anos entre o término do mandato e a instauração da TCE, sem ocorrência de qualquer marco interruptivo. Isso porque, conforme aponta o relator, no bojo da Representação fora determinada, por diversas vezes, a conclusão do PAD, não havendo nenhuma determinação de cunho apuratório ou de responsabilização pelo respectivo dano. Nesse sentido:
[...] Nesse cenário, tenho por acompanhar o Corpo Técnico e o MPC, visto que, se considerarmos que a Senhora Lucimeire Tamandaré Gonçalves Neves exerceu o cargo de diretora administrativa no período de 06.12.2011 a 23.04.2015, consoante relatório conclusivo da comissão de tomada de contas especial (ID 1189169), sem haver nenhum incidente que interrompesse a prescrição ou até mesmo exame de mérito da matéria, não há dúvidas de que ocorreu a prescrição das pretensões punitiva e de ressarcimento no caso em apreço, eis que, entre o período final do exercício do mandato e a protocolização do processo de TCE nesta Corte em 22.04.2022, transcorreram mais de 5 (cinco) anos. [...]
Pois bem.
Prescreve em cinco anos a pretensão punitiva e ressarcitória desta Corte, consoante dispõe a Lei Estadual 5.488/22, cujo termo inicial de contagem varia a depender da especificidade do caso, podendo ser contabilizado a partir dos marcos elencados no art. 6º da mesma lei, adiante transcrito.
Art. 6°O prazo de prescrição será contado:
I - da data do fato gerador, da data em que foi praticado o ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado;
II - da data em que as contas deveriam ter sido prestadas, no caso de omissão de prestação de contas;
III - da data da apresentação da prestação de contas ao órgão competente para a sua análise inicial;
IV - do recebimento da denúncia, da representação pelo órgão competente ou pelos órgãos de controle interno, quanto às apurações decorrentes de processos dessas naturezas;
V - da data do conhecimento da irregularidade ou do dano, quando constatados em fiscalização realizada pelo órgão competente, pelos órgãos de controle interno, onde ocorrer a irregularidade; ou
VI - do dia em que tiver cessado a permanência ou a continuidade, no caso de irregularidade permanente ou continuada.
Iniciado o prazo prescricional, ademais, a lei elenca diversas hipóteses de interrupção da prescrição, as quais devem incidir de forma isolada, uma única vez no processo, em atenção ao que dispõe o §1º do art. 7º da mesma lei. Interrompido o prazo prescricional, a contagem será retomada pela metade, consoante art. 8º, cuja redação deve ser interpretada a luz da Súmula 383 do STF.
Pela pertinência, transcreve-se os dispositivos legais relevantes:
Art. 7°Interrompe-se a prescrição da ação punitiva:
I - pela notificação, oitiva, citação ou audiência do responsável, inclusive por edital;
II - por qualquer ato inequívoco de apuração do fato;
III - por qualquer ato inequívoco de tentativa de solução conciliatória; ou
IV - pela decisão condenatória recorrível.
§ 1°A prescrição somente poderá ser interrompida uma vez.
§ 2°A citação inicial não interrompe a prescrição quando, por qualquer motivo, o processo tenha sido anulado.
§ 3°Não interrompem a prescrição o pedido e concessão de vista dos autos, emissão de certidões, prestação de informações, juntada de procuração ou substabelecimento e outros atos de instrução processual de mero seguimento do curso das apurações.
Art. 8°A prescrição interrompida retoma a tramitação com a contagem pela metade do prazo, da data do ato que a interrompeu ou do último ato ou termo do respectivo processo.
Do que se vê, ainda que a lei preveja diversas hipóteses de início e interrupção do prazo, o legislador não fixa balizas claras para aplicação de uma hipótese em detrimento de outra, competindo ao interprete/julgador aferir as hipóteses que melhor se amoldam a situação em apreciação. Essa análise subjetiva, no entanto, pode gerar desacordos entre intérpretes, tornando tormentosa a análise da matéria.
No caso, com as devidas vênias ao entendimento firmado pelo e. relator, divirjo pontualmente do termo inicial indicado e verifico hipótese interruptiva, de modo a concluir pela não ocorrência de prescrição no caso. Explica-se.
Do que consta nos autos, esta Corte tomou ciência da irregularidade por ocasião do recebimento de Representação n. 2052/2018-TCERO, oportunidade na qual determinou à Administração do Município de Machadinho do Oeste, por meio de seu controle interno, a adoção de medidas para apuração das possíveis irregularidades em questão, verificando e quantificando o dano causado pelo suposto recebimento de diárias sem devida comprovação, consoante teor da DM 0217/2018-GCVCS – primeira DM proferida naqueles autos, que apresenta a seguinte parte dispositiva:
[...] Posto isso, com fulcro nos princípios da eficiência, economicidade, relevância e celeridade processual, na linha do §3º do art. 247 do Regimento Interno/TCE-RO, c/c artigos 2º, 4º, 6º da Resolução N. 210/2016/TCE-RO, prolato a seguinte DECISÃO MONOCRÁTICA: I. Submeter a presente Representação ao Procedimento Abreviado de Controle, com fundamento na economicidade, bem como na baixa relevância constatada por não compreender a matéria em elevada repercussão social;
II. Determinar, o retorno dos autos à Secretaria Geral de Controle Externo, para adoção das seguintes medidas, com a devida observância do disposto nos artigos 7º e 8º da Resolução N. 210/2016/TCE-RO: a. Informar ao DDP, para fins de registro no PCe, a submissão dos autos ao Procedimento Abreviado de Controle; e
b. Expedir Ofício ao Órgão Central do Sistema de Controle Interno do município de Machadinho do Oeste-RO, determinando-lhe que averigue, no prazo de 45 dias, a real situação do já iniciado processo de sindicância para apuração das irregularidades e que, em sendo procedentes, adote as medidas legais para quantificar o possível dano causado ao erário e responsabilizar os agentes públicos que tenham incorrido na infringência, tomando as providências necessárias para ressarcir o Erário de eventual prejuízo. Comunicando ao Tribunal a adoção das aludidas providências.
III. Sobrestar o procedimento pelo prazo de 01 (um) ano, adotando-se o devido acompanhamento na forma prescrita nos artigos 7º e 8º da Resolução N. 210/2016/TCERO; [...]
E do que se extrai do PCe, a Representação 02052/2018-TCERO foi recebida em maio de 2018, momento em que essa Corte tomou conhecimento da irregularidade e que, nos termos do inciso IV do art. 6º da Lei 5.488/22, deu início a contagem do prazo prescricional quinquenal.
Ciente da irregularidade e considerando a existência de procedimento já em andamento no Município, esta Corte optou por determinar ao Controle Interno do Município, por meio da DM 0217/2018-GCVCS, a apuração das irregularidades e adoção das “medidas legais para quantificar o possível dano causado ao erário e responsabilizar os agentes públicos que tenham incorrido na infringência, tomando as providências necessárias para ressarcir o Erário de eventual prejuízo”, ato esse que, salvo melhor juízo, traduz inequívoca apuração dos fatos.
A inequívoca apuração dos fatos, consoante art. 7º, II, da Lei 5.488/22, é hipótese de interrupção do prazo prescricional, a qual pode ser interpretada à luz da Decisão Normativa 01/2018/TCERO, que elenca, de forma exemplificativa, diversas hipóteses aptas a caracterização da inequívoca apuração, dentre as quais está o proferimento de simples despacho que ordena a apuração dos fatos.
No caso, após conhecimento dos fatos, esta Corte transferiu ao controle interno a incumbência de apurar a irregularidade, quantificar o dano e buscar o ressarcimento ao erário, por meio da DM-GCVCS-TC 0217/2018-GCVCS[2], ato esse que deve ser interpretado como inequívoca apuração, ainda que tenha tido por finalidade incumbir o controle interno dessa missão, e não a unidade técnica desta Corte.
Sendo o caso, o termo inicial da contagem do prazo deve ser a data do recebimento da Representação em maio de 2018, tendo o prazo sido interrompido já em 03 de setembro de 2018 com a prolação da DM 0217/2018-GCVCS, ou seja, 3 meses depois.
No caso, interpretando-se o art. 8º da Lei 5.488/22 à luz da Súmula 383 do STF, conclui-se que a retomada do prazo prescricional, após interrupção, deve se dar pelo tempo restante da prescrição, que é de 4 anos e 9 meses. Nesse sentido, conclui-se que o prazo prescricional se findará em maio de 2023.
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Termo inicial
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Marco interruptivo
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Termo final
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Previsão legal
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Art. 6º, IV, Lei 5.488/22 - do recebimento da denúncia, da representação pelo órgão competente ou pelos órgãos de controle interno, quanto às apurações decorrentes de processos dessas naturezas;
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Art. 7°, Lei 5.488/22: Interrompe-se a prescrição da ação punitiva:
II - por qualquer ato inequívoco de apuração do fato;
Art. 3º, §2º, a, DN 01/2018-TCERO:
§2º Consideram-se atos inequívocos de apuração do fato, entre outros, os seguintes (o que ocorrer primeiro): a) o despacho que ordenar a apuração dos fatos;
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Súmula 383 do STF:
A prescrição em favor da Fazenda Pública recomeça a correr, por dois anos e meio, a partir do ato interruptivo, mas não fica reduzida aquém de cinco anos, embora o titular do direito a interrompa durante a primeira metade do prazo.
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Ato relevante
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Protocolo Maio de 2018
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03 de setembro de 2018
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maio de 2023
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Ante o exposto, nos termos ora fundamentado e com as vênias necessárias, divirjo do voto apresentado pelo e. Conselheiro Relator, a fim de reconhecer a não ocorrência de prescrição.
Nada obstante, e atento ao fato da presente Tomada de Contas Especial ainda não ter sido instruída nesta Corte e por não haver nos autos a incidência de novos marcos interruptivos, imperioso reconhecer que não haverá tempo hábil suficiente para finalização de sua instrução e posterior julgamento, diante da iminência da prescrição, circunstância que, em atenção aos princípios da eficiência e racionalidade administrativa, prejudica o interesse de agir desta Corte na continuidade do presente feito.
Ainda a título de acréscimo, vejo pertinência seja dado conhecimento dos fatos ao Ministério Público Estadual, nos moldes do art. 7º da Lei 8.429/92, a fim de que adote as providências que entender necessárias, considerando a possibilidade de eventual ato doloso de improbidade administrativa.
É como voto.
[1]ID’s 1189263 a 1189272.
[2] Publicada em 03/09/2018, consoante Certidão de ID 664124 dos autos da Representação
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