Manifestação Eletrônica do MPC
23/02/2024 21:48
|
Tratam os autos de recurso apresentado pelo servidor Hacálias Borges Nascimento, Analista Administrativo, matrícula 454, em face da Decisão Monocrática DM 0535/2023-GP, proferida nos autos do processo SEI n. 5566/2023, que indeferiu o pedido de redução da carga horária de trabalho, sem prejuízo de sua integral remuneração, formulado com fundamento na necessidade de prestar cuidados ao filho menor, que é portador de Transtorno do Espectro Autista (TEA).
O pedido original, que tramitou no SEI/TCERO 5566/2023, foi indeferido ao fundamento de que não ficou demonstrado suficientemente que a assistência e o cuidado direto do filho do servidor requerente se fazem de modo exclusivo por ele, de forma que a redução da carga horária de trabalho não seria medida imprescindível à preservação do melhor interesse do menor. Seguem os fundamentos da decisão recorrida:
7. Tanto a Constituição Estadual de Rondônia (art. 22) como a Lei Complementar n° 68/1992 (art. 277) põem a salvo o direito à redução da carga horária de trabalho, sem prejuízo de sua integral remuneração, ao servidor público que tenha filho ou dependente com deficiência. O bem jurídico tutelado é, senão, a pessoa com deficiência (e não o servidor), de modo a possibilitar que o seu cuidador tenha o tempo necessário para melhor assisti-la, conforme asseguram os princípios constitucionais direcionados à dignidade da pessoa humana, à saúde, à educação e ao convívio familiar.
8. O benefício legal, contudo, não é de caráter geral, mas apenas para o servidor que lograr êxito na comprovação de ser o responsável pelo auxílio direto à pessoa com deficiência, sem o qual não terá a assistência permanente necessitária para a sua subsistência.
9. Na hipótese vertente, a diligente manifestação da SGA evidenciou que o conjunto probatório juntando aos autos convergem para o entendimento de que a assistência e o cuidado direto ao seu filho (portador de TEA e TDAH) não se fazem de modo exclusivo ou principal pelo requerente – mas, ao que tudo indica, de forma compartilhada com sua cônjuge –, assim como de que inexiste risco de solução de continuidade do tratamento terapêutico feito pelo seu filho, uma vez que é realizado fora do horário de expediente do servidor. Logo, vê-se que a redução da carga horária de trabalho do interessado não é medida imprescindível à manutenção da assistência de que carece o seu filho.
10. À vista disso, inviável juridicamente o reconhecimento em favor do servidor do preenchimento dos requisitos para a concessão do benefício da redução da carga horária de trabalho, sem prejuízo de sua integral remuneração, com fulcro no art. 22 da Constituição Estadual de Rondônia, c/c o art. 277 da Lei Complementar n° 68/1992, o que inviabiliza o deferimento da demanda.
11. Cumpre destacar, por fim, que para além da jornada regular de trabalho mais benéfica (reduzida), de 30 (trinta) horas semanais, constam à disposição dos servidores alternativas outras que reúnem grande potencial de auxiliá-los nessa importante tarefa de conciliar seus interesses pessoas e profissionais, sem prejuízo tanto do desempenho laboral satisfatório, como do auxílio necessário ao seu dependente. Estou a falar das jornadas diferenciadas de trabalho instituídas nesta Corte de Contas por meio da Resolução n° 305/2019/TCE-RO, a exemplo da jornada flexível e do teletrabalho.
12. Não se quer com isso desconsiderar ou infirmar a legitimidade do direito/benefício ora requestado, mas, tão somente, destacar o seu caráter residual, tendo em vista as variadas possibilidades disponíveis de atuação funcional (vários regimes laborais), o que reclama a avaliação do caso concreto em conformidade com o grau de necessidade de cada servidor, a fim de se adotar a solução (opção) mais adequada ao postulante e menos onerosa à Administração Pública.
13. Ante o exposto, decido:
I – Indeferiro pedido formulado pelo servidor Hacalias Borges Nascimento, por meio do Requerimento Geral (0563602); e
II - Determinarà Secretaria Executiva da Presidência – SEEXPRES que proceda à publicação desta Decisão no Diário Oficial Eletrônico desta Corte de Contas, à ciência do interessado, bem como à remessa do presente feito à Secretaria-Geral de Administração – SGA para as providências cabíveis.
É como decido.
Diante da referida decisão, o servidor apresentou Pedido de Reconsideração (SEI/TCERO n. 008413/2024), recebido como Recurso ao Conselho Superior de Administração, analisado pela Presidência do Tribunal de Contas, cujo Despacho de ID 0624703, em juízo de reconsideração, manteve a decisão recorrida em seus próprios fundamentos e determinou a sua distribuição a um dos Conselheiros Titulares da Corte, sendo atribuído ao Conselheiro Jailson Viana de Almeida.
É o relatório.
Preliminarmente, verifica-se que foram preenchidos os pressupostos de admissibilidade previstos nos artigos 146 e 147 da Lei Complementar Estadual n. 68/92, o que permite o conhecimento do recurso.
No mérito, opina o Ministério Público de Contas que o Recurso seja parcialmente deferido, permitindo-se a redução da jornada laboral na exata medida da demonstração da necessidade que foi trazida aos autos, ou seja, nos impedimentos da genitora. Explica-se.
A Constituição do Estado de Rondônia estabelece o seguinte quanto à redução de jornada laboral de servidores públicos estaduais que sejam responsáveis legais por pessoa com deficiência:
Art. 22. O servidor público que seja responsável legal e cuide diretamente de portador de necessidade especial que, comprovadamente, necessite de assistência permanente, independentemente de estar sob tratamento terapêutico, terá redução de 50% (cinquenta por cento) de sua carga horária de trabalho, sem prejuízo de sua integral remuneração.
§ 1° Para fins de concessão do benefício de que trata este artigo, considera-se portador de necessidade especial, a pessoa de qualquer idade portadora de deficiência física ou mental comprovada e que tenha dependência sócio educacional e econômica do servidor público.
§ 2° A redução da carga horária de que trata este artigo perdurará enquanto permanecer a necessidade de assistência e a dependência econômica do portador de necessidade especial.
§ 3º Nos casos em que a deficiência for confirmadamente considerada irreversível, a concessão de que trata este artigo será definitiva, devendo o servidor comprovar, anualmente, apenas a dependência econômica.
Assim, apresentam-se como requisitos (i) o cuidado direto de pessoa com deficiência, (ii) a necessidade de assistência permanente, (iii) a dependência sócio educacional e econômica do servidor e (iv) a atualidade da necessidade de redução da carga horária.
Inicialmente, na decisão recorrida, consignou-se importante fundamento para o indeferimento do pedido do recorrente, a saber, a ausência de demonstração de que o servidor é responsável exclusivo e/ou principal de seu filho, in verbis:
9. Na hipótese vertente, a diligente manifestação da SGA evidenciou que o conjunto probatório juntando aos autos convergem para o entendimento de que a assistência e o cuidado direto ao seu filho (portador de TEA e TDAH) não se fazem de modo exclusivo ou principal pelo requerente – mas, ao que tudo indica, de forma compartilhada com sua cônjuge –, assim como de que inexiste risco de solução de continuidade do tratamento terapêutico feito pelo seu filho, uma vez que é realizado fora do horário de expediente do servidor. Logo, vê-se que a redução da carga horária de trabalho do interessado não é medida imprescindível à manutenção da assistência de que carece o seu filho.
10. À vista disso, inviável juridicamente o reconhecimento em favor do servidor do preenchimento dos requisitos para a concessão do benefício da redução da carga horária de trabalho, sem prejuízo de sua integral remuneração, com fulcro no art. 22 da Constituição Estadual de Rondônia, c/c o art. 277 da Lei Complementar n° 68/1992, o que inviabiliza o deferimento da demanda.
Conforme constou na DM 0535/2023-GP, “o conjunto probatório juntando aos autos convergem para o entendimento de que a assistência e o cuidado direto ao seu filho (portador de TEA e TDAH) não se fazem de modo exclusivo ou principal pelo requerente”, ou seja, não houve o preenchimento do requisito de cuidado direto de pessoa com deficiência.
Em tempo, o argumento de que “inexiste risco de solução de continuidade do tratamento terapêutico feito pelo seu filho, uma vez que é realizado fora do horário de expediente do servidor” não subsiste, posto que a Constituição Estadual excepciona a necessidade de tratamento terapêutico para a concessão da redução da jornada.
Nessa linha, quando da apresentação do recurso, o servidor recorrente informa no tópico “horários de trabalho da mãe” que, por vezes, a indisponibilidade da presença da mãe em razão do trabalho o coloca como cuidador principal, juntando a escala mensal de trabalho dela como prova.
Em análise a tal argumento, a Presidência da Corte de Contas, no Despacho de ID 0624703, aduziu que as incompatibilidades de horários dos genitores são mínimas e, por isso, não excedem a razoabilidade. Nesse tocante, fundamentou-se o seguinte:
36. Note-se que durante todo o mês de novembro, ambos os servidores laboraram em apenas 3 (três) dias simultâneos. Em relação a esses 3 (três) dias, em 1 (um) deles houve compatibilidade da jornada, e nos outros 2 (dois) dias, a jornada de trabalho de sua esposa excedeu a do servidor.
37. Não se ignora que mesmo em rotinas familiares bem estruturadas, em que as responsabilidades parentais são compartilhadas, como inclusive parece ser o caso do servidor, haja eventuais incompatibilidades entre horários e obrigações, a exigir naturalmente a necessidade de uma adaptação minimamente razoável.
38. Em tais situações, em que as incompatibilidades não excedem a razoabilidade, mormente porque ausente a demonstração de prejuízos outros, não nos parece viável a concessão do benefício especial de redução da jornada de trabalho, que, por se tratar de uma medida excepcional, reclama a demonstração de sua indispensabilidade com vistas a salvaguardar os interesses da pessoa com deficiência.
39. O fato de não se vislumbrar qualquer fator superveniente que possa ter impactado negativamente na rotina por ambos ajustada, que até então, ao que parece, tem sido suficiente para a garantia da assistência de que necessita seu filho, corrobora o entendimento no sentido de que a redução da jornada de trabalho do servidor não perfaz medida indispensável à manutenção dos cuidados de seu dependente.
40. A reforçar nossa conclusão nesse sentido, tem-se, ainda, que atualmente constam à disposição dos servidores alternativas outras que reúnem grande potencial de auxiliá-los nessa importante tarefa de conciliar seus interesses pessoais e profissionais, sem prejuízo tanto do desempenho laboral satisfatório, como do auxílio necessário aos seus dependentes.
Novamente, faz-se o aparte de que os requisitos constantes na Constituição Estadual para a concessão de redução de jornada laboral são o cuidado direto de pessoa com deficiência, o que ocorre nos dias de impossibilidade da genitora; a necessidade de assistência permanente, indicada em laudo médico; a dependência sócio educacional e econômica do servidor, já comprovada junto ao Tribunal; e a atualidade da necessidade de redução da carga horária, que, conforme o próprio requerimento do servidor, circunscreve-se aos momentos de indisponibilidade da genitora.
Pondera-se que a momentaneidade da necessidade da presença exclusiva do recorrente coaduna-se com o requisito de “cuidado direto” do dependente com deficiência, o que, somado ao requisito da “atualidade da necessidade” permite decisão sui generis que autorize a redução da jornada laboral do servidor quando demonstrada a sua necessidade, ou seja, quando impossível a presença da genitora, conforme arrazoado do próprio recorrente, devendo, para tanto, ser apresentada a escala mensal de serviço da genitora a fim de adequar a jornada do servidor na exata medida da necessidade comprovada.
Diante do exposto, o Ministério Público de Contas opina, preliminarmente, pelo conhecimento do recurso formulado pelo servidor Hacálias Borges Nascimento em face da Decisão Monocrática DM 0535/2023-GP e, no mérito, pelo seu parcial provimento para conceder a redução de jornada de trabalho do servidor à razão de 50% de sua jornada diária, exclusivamente nos dias em que demonstrar, previamente, a impossibilidade da presença da genitora, devendo, para tanto, juntar periodicamente a escala de serviço da genitora a fim de adequar a jornada do servidor à exata medida da necessidade comprovada.
É o opinativo.
|